CARTA DE REPÚDIO ÀS DEMISSÕES NA CEDAE
Quanto valem quase dois mil anos somados de experiência profissional? Para o novo presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), Hélio Cabral, a resposta é: nada. No dia 15 de março de 2019, 50 funcionários concursados, a maioria engenheiros com 25 a 40 anos de casa, foram demitidos. O ato atingiu os pilares da empresa, removendo dela profissionais com grande conhecimento técnico e gerencial, o que causa graves riscos para cerca de 13 milhões de pessoas em 64 municípios do Estado do Rio de Janeiro atendidas pela companhia.
A alegação de que era preciso economizar eliminando os maiores salários da empresa não se justifica diante do lucro registrado em 2018, de R$ 750 milhões. Se a explicação fosse verdadeira, a companhia teria parado de contratar funcionários extraquadros, muitos sem qualquer experiência e com salários altos, o que não aconteceu. Também não teria criado um jeton por reunião da diretoria no valor de R$ 1.500.
Além disso, a cláusula 41 do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) que prevê a possibilidade de dispensa de 1% do quadro funcional após cada negociação de dissídio não significa uma licença para demitir, mas a garantia de emprego para 99% dos trabalhadores. Evidentemente, esse 1% só pode ser dispensado diante de motivação de ato administrativo, como ocorre com qualquer concursado.
A Cedae é uma companhia de economia mista, superavitária, e os salários de seus funcionários são compatíveis com o que é pago no setor. A companhia foi eleita em 2018 pela Revista Exame como a melhor empresa de infraestrutura do Brasil e seu Planejamento Estratégico para 2017-2021 aponta como uma das principais forças o seu “corpo técnico qualificado”. Logo, estas dispensas impactam também no valor da companhia.
Curioso o fato de que pelo menos um diretor, contratado recentemente após as demissões, tenha deixado a direção de uma empresa privada, que tem interesse na privatização da companhia, para receber um salário muito menor na Cedae. O que explica o altruísmo?
A verdade é que estas demissões têm motivação política e visam a acelerar o processo de privatização da Cedae. Elas fragilizam o sistema de saneamento e abastecimento de água do estado, que se constitui em uma engrenagem extremamente complexa com maquinários feitos especialmente para a companhia, que só existem na Cedae. A memória destes funcionários, com média de 30 anos de casa, precisa ser preservada e transmitida.
Diante de tudo isso, a pergunta que deve ser feita não é o quanto custa ter estes profissionais, mas o quanto eles valem para a empresa e para a sociedade.
Rio de Janeiro, 25 de março de 2019