—A Cedae tem que ser privatizada antes de 2020, quando vence o prazo atual do Plano de Recuperação Fiscal ( que está sendo renegociado ). Podemos vender a empresa em um leilão, como também fazer um IPO ( oferta pública inicial ) da companhia para torná-la cada vez mais competitiva, transparente e eficiente — disse Wilson Witzel em uma entrevista coletiva.
A declaração contradiz o discurso de campanha de Witzel e seu posicionamento nos primeiros dias de governo, quando afirmava ser contrário à privatização. Ele mudou o tom em meio ao cenário de crise financeira e à discussão, no Congresso Nacional, de um novo marco regulatório para o saneamento, que deve ampliar o interesse da iniciativa privada na prestação de serviços. Segundo estimativas do Palácio Guanabara, o novo marco regulatório elevaria o valor da Cedae para R$ 10 bilhões.
Foi essa possibilidade que levou Witzel a pedir ao BNDES, em junho, que refizesse os estudos sobre a venda. Contratado na gestão do ex-governador Luiz Fernando Pezão para traçar a modelagem de venda da Cedae, o BNDES não havia levado em consideração a votação do novo marco regulatório em Brasília.
Ao GLOBO, o governador explicou que, caso o estado opte por vender ações, manterá o controle majoritário da companhia, com 51% das ações. Por sua vez, a opção pela privatização não seria em sua integralidade. A ideia seria fazer concessões dos serviços de água e esgoto à iniciativa privada apenas em algumas regiões do estado. Na capital, por exemplo, parte dos serviços de esgoto já foi privatizada. Mas o modelo é diferente. A prefeitura fez a concessão do serviço na área conhecida como AP 5 (Zona Oeste, menos Barra, Recreio e Jacarepaguá), de modo que uma empresa privada fatura pelo tratamento de esgoto e paga à Cedae pelo fornecimento da água.
A ideia de Witzel de vender 49% das ações da Cedae, permanecendo com o controle acionário da companhia, é vista com reservas pelo economista Frederico Turolla, da empresa de consultoria Pezo Economics.
—Se isso acontecer, o estado não terá parceiros para o negócio. O investidor privado tem que assumir o controle da empresa para fazer a reestruturação necessária. A melhor alternativa seria privatizar — disse Turolla.
Já criticado pelo Conselho de Supervisão do Regime de Recuperação Fiscal por conta de um atraso de nove meses no cronograma, o governo estadual terá que correr para cumprir o prazo de venda da Cedae e conseguir pagar o que deve. O agravante é que muitas iniciativas não dependem do Palácio Guanabara. O próprio Witzel admite que precisa aguardar o Congresso aprovar o novo marco regulatório do saneamento, o que ainda não tem data para acontecer. A proposta que modifica as regras em vigor é do senador Tasso Jereissatti (PSDB-CE ). Atualmente, o projeto tramita na Câmara dos Deputados e, caso sofra modificações, ainda terá que retornar ao Senado. A versão em debate na Câmara prevê que tanto empresas públicas como privadas possam participar das concorrências. Também é possível licitar operações de serviços de água e esgoto em blocos.
O relator do projeto na Comissão Especial de Saneamento, deputado Geninho Zuliani (SP), acredita que seu parecer será votado em 15 de outubro. A expectativa é que o plenário aprecie a matéria até o dia 31 do mês que vem. No Senado, a assessoria de Jereissati prefere não fazer previsões. Após a sanção presidencial, a Agência Nacional de Águas (ANA) ainda vai regulamentar detalhes da lei.
Há ainda outras questões a serem resolvidas nos próprios limites do estado. Desde o fim de 2018, quando passou a vigorar a lei que criou o Instituto Rio Metrópole , o planejamento de programas estratégicos depende de análise prévia das 22 prefeituras que integram a região, por serem atividades que podem afetar diretamente o dia a dia das cidades. Decisões, inclusive sobre a Cedae, são tomadas pelo governador (que preside o órgão) e representantes das prefeituras e da sociedade civil. O número de votos é proporcional à população das cidades.
Seja qual for o modelo, a privatização da Cedae é quase inevitável, como admitem fontes do Palácio Guanabara, porque, mesmo que Witzel consiga aprovar no Ministério da Economia as mudanças que deseja no Regime de Recuperação Fiscal, ainda terá dificuldades para equilibrar as contas. O estado precisa de cerca de R$ 4 bilhões (levando-se em conta juros acumulados) para honrar um empréstimo com o Banco BNP Paribas, firmado no fim de 2017. Na época, o governo colocou salários em dia e usou a Cedae como garantia de pagamento.