A privatização da Cedae, a licitação dos ônibus intermunicipais, novos investimentos para despoluir a Baía de Guanabara e programas habitacionais para população de baixa renda estão entre os projetos estratégicos do governo do estado. No entanto, a forma com que esses projetos serão implantados segue em compasso de espera. Desde o fim de 2018, quando entrou em vigor a lei que criou o Instituto Rio Metrópole, o planejamento de programas estratégicos depende de análise prévia das 22 prefeituras que integram a região, já que são programas que podem afetar diretamente o dia-a-dia dessas cidades. Ou seja, no caso do estado realmente tentar privatizar a Cedae, as regras teriam que ser analisadas também pelos municípios. Mas o conselho deliberativo, formado pelo governador Wilson Witzel e os prefeitos só se reuniu uma única vez para discutir a base jurídica da instituição. Esses temas só começarão a ser tratados em uma reunião prevista para setembro.
Mais cedo, O GLOBO publicou que o conselho jamais havia se reunido. No início da tarde, o Palácio Guanabara divulgou uma nota na qual esclareceu que, no dia 27 de fevereiro, houve uma reunião de instalação do conselho no Centro de Comando e Controle, na Cidade Nova. Nesse encontro, ficou determinada a elaboração da base legal da entidade, que ainda terá que ser aprovada pelo Conselho Delberativo. Esses documentos deverão ser referendados em uma reunião no dia 18 de setembro. Nesse dia, também haverá discussão com os prefeitos sobre mobilidade urbana, saneamento e habitação.
Pelas regras do Instituto Rio Metrópole, as decisões sobre investimentos e políticas públicas que atingem mais de uma cidade da região em áreas como infraestrutura, saúde e saneamento são tomadas por um órgão deliberativo e têm que passar pelo governador (que preside o órgão) e os 22 prefeitos. Ao todo, são 49 conselheiros, mas para as deliberações, as decisões seguem um critério misto. O número de votos é proporcional à população de cada cidade, e a sociedade civil também tem três assentos. A maior influência é exercida pelo governo do Estado (25% dos votos) e a capital (15%). As medidas só serão aprovadas com 60% dos votos e o apoio de metade dos conselheiros contados individualmente. A previsão é que a entidade se reúna pelo menos uma vez por semestre.
Em meio a esse processo, há ainda um componente de insegurança jurídica. Após não conseguir levar a frente o projeto de fazer uma concessão da implantação de redes de esgotos na chamada AP-4 (Barra, Recreio e Jacarepaguá) justamente porque a questão deveria ser analisada de forma integrada, o prefeito Marcelo Crivella entrou em maio com uma ação de inconstitucionalidade contra Lei Complementar 184/2018, que criou o Instituto Rio Metrópole. Na ação, o prefeito questiona a ingerência do estado sobre questões da capital. O processo ainda não tem prazo para ser julgado pelo Órgão Especial.
A capital tem mais pendências. Uma das mais urgentes é definir o futuro do corredor de BRT Transbrasil, que vai ligar Deodoro ao Centro. Só que o Instituto Rio Metrópole tem que deliberar sobre eventual reorganização das linhas intermunicipais que chegam ao Rio. Sem que seja batido o martelo, por exemplo, as linhas da Baixada Fluminense, Niterói e São Gonçalo que vão continuar a operar no Terminal Américo Fontenelle (Central do Brasil) impedem que o Sindicato das Empresas de ônibus do Rio (Rio Ônibus) dimensione e compre coletivos articulados para operar a frota. Uma das consequências desse atraso é que a prefeitura decidiu iniciar a operação do corredor de BRT (que custou R$ 1,4 bilhão em obras que já duram cinco anos) como um corredor de BRS. Mesmo sem definição, no dia 1º de agosto, o município assinou um aditivo de R$ 255,7 milhões para construir dois terminais de integração nos trevos das Margaridas e das Missões.
— As questões que precisam ser debatidas envolvem todas as prefeituras da região metropolitana. Sem essa discussão, programas importantes não podem ser levados adiante — diz o coordenador-executivo da Casa Fluminense, Henrique Silveira, que preside um conselho de caráter consultivo da entidade, formado por representantes da Sociedade Civil.
O secretário de governo, Claiton Rodrigues, diz que as discussões do conselho vão começar em breve com a participação dos prefeitos:
— Isso não vai prejudicar o andamento dos projetos. Não há atraso. O prazo é razoável. O problema é que encontramos o estado em uma situação difícil, que exigiu reestruturações administrativas.
O deputado Waldeck Carneiro (PT), que preside uma comissão especial que acompanha o processo, lamenta a indefinição:
— Essa situação é ruim para a definição de políticas públicas. Se o governo do estado quer fazer a concessão da Cedae, vai ter que discutir com os municípios primeiro, por exemplo. Na mesma situação, estão estratégias para sanear a Baixada — disse Waldeck.
O prefeito de Caxias, Washington Reis (MDB) observa que a legislação estabelece restrições de despesas para o último ano de governo, o que pode vir a ser um problema. A lei que regulamentou a criação do conselho prevê, por exemplo, que os municípios podem ratear despesas para a execução de projetos considerados prioritários no conselho.
— Vamos supor que alguma deliberação exija despesas de longo prazo dos municípios. A implantação dos programas vai exigir que o prefeito tenha recursos em caixa para o sucessor. Isso pode ser um problema, porque as prefeituras ainda enfrentam dificuldades financeiras por causa da crise econômica — disse Washington Reis.
O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PDT) também tem pendências. Uma delas é justamente com o BRT Transbrasil, que pode exigir mudanças nos itinerários das linhas que vêm da cidade em direção ao Rio.
— Diferente de estados como Minas e São Paulo, o Rio tem cerca de 70% de sua população vivendo na região metropolitana. Mas a cidade não é uma ilha. O desafio é viabilizar uma governança compartilhada para superar problemas históricos, como por exemplo, a poluição da Baía de Guanabara e a mobilidade urbana — disse Neves.
Hoje, nem mesmo o site da Câmara Metropolitana (que antecedeu o formato atual), criado quando as discussões sobre a entidade começaram na Alerj em 2015, é atualizado. Na última notícia que consta na página, a informação se refere a uma reunião com o ex-governador Francisco Dornelles. A informação sobre a composição do órgão ainda são de 2018.
Procurada desde sábado, a prefeitura do Rio não se manifestou.