Artigo: O desmonte da Cedae
Direção da empresa corta no essencial, o conhecimento profissional dos técnicos, e gasta no supérfluo
Luiz Paulo Correa da Rocha e Lucinha
Embora o governador Wilson Witzel afirme não interessar ao estado privatizar a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae), que só no ano passado teve lucro de R$ 750 milhões, é fato que está em curso pelo gestor da companhia um processo de desmonte técnico da mesma. São muitos os indícios de que a companhia – ou melhor, a parte lucrativa dela – desperta muitos interesses. O pior cego é aquele que não quer ver.
A demissão coletiva, no dia 15 de março, de 54 funcionários que tinham entre 25 e 40 anos de casa, verdadeiros pilares e memória da empresa, com grande conhecimento técnico e experiência de gestão, é apenas um desses sinais. O argumento de que se está cortando supersalários, que seriam superiores a R$ 35 mil, tem sido repetido à exaustão pelo atual presidente da Cedae, Hélio Cabral, tentando convencer a opinião pública de que é um “caçador de marajás” que deseja maximizar resultados. Corta no essencial, o conhecimento profissional dos técnicos, e gasta no supérfluo: viaturas, assessores, gratificações. Entretanto, carece de lógica tal medida, pois não veio precedida de um plano de gestão, tampouco de uma aprofundada análise de risco de tal decisão.
Certo é que as mencionadas demissões alcançaram funcionários em posições estratégicas da empresa. Não resta dúvida ser temerária a atitude de desligamento destes colaboradores tão qualificados, sem cotejar vantagens e desvantagens técnicas, operacionais, de segurança e, também, humanas de tais medidas, tendo como foco o interesse público e a qualidade do serviço a ser prestado. Posto que tal atitude pode causar graves riscos ao sistema de abastecimento de água e esgoto, em caso de eventuais emergências: na qualidade da água, rompimentos de adutoras, colapso no sistema de bombeamento do Lameirão ou até eventual paralisação dos Sistemas Guandu e Imunana-Laranjal, que poderia vir a afetar milhares de pessoas.
Enquanto promove a sua caçada particular, em detrimento dos serviços prestados pela empresa, o novo presidente da Cedae se esquece da tragédia de Mariana de 2015, ocasionada pela Vale/Samarco, empresa em que trabalhou como conselheiro administrativo. Segundo denúncia do Ministério Público, os dirigentes atuaram visando a maximizar os resultados financeiros da companhia, tão apreciados pelo mercado (lucros e dividendos), apesar de estarem cientes dos riscos que a barragem do Fundão representava para vidas humanas e o meio ambiente.
A Cedae atende hoje a 13 milhões de pessoas, que vivem em 64 municípios do Estado do Rio. Foi considerada pela revista “Exame” a melhor empresa do setor de infraestrutura do país, em 2018. Ao longo de décadas, a companhia construiu uma infraestrutura que poucas empresas no mundo têm. O Sistema Guandu, por exemplo, é o maior do mundo, segundo o Guiness. Em tempos pretéritos, já tentaram dilapidar a empresa. Parece que o pesadelo pode voltar. Tem muita gente querendo beber dessa água e, infelizmente, tudo indica que não há interesse público envolvido nisso. Há que se resistir.
Luiz Paulo Correa da Rocha e Lucinha são deputados estaduais (PSDB) no Rio